Quando Deus fala...
Quando Deus fala as coisas nunca mais são as mesmas. Pois, a palavra de Deus abala, transforma, questiona a tudo e a todos por inteiro. A palavra de Deus desnuda a nossa realidade. Mostra quem somos. É um espelho que, de forma assustadora, revela com clareza quase insuportável, quem realmente somos. O relato bíblico em torno à pesca maravilhosa deixa isso tão claro. Senão vejamos: quando os pescadores Simão, Tiago e João, desanimados, lavavam as redes depois de uma inútil noite de pescaria eles receberam uma palavra de Jesus que lhes dizia para lançarem a rede ao lago, uma vez mais. Relutantes os pescadores decidem seguir esta estranha palavra de Jesus e, em surpresa absoluta, tem os seus barcos apinhados de peixes. O interessante, no entanto, é que Pedro parece nem conseguir olhar para os peixes, saboreando a bela pescaria. Pelo contrário, ele olha para dentro de si: "Vendo isto, Simão Pedro prostrou-se aos pés de Jesus, dizendo: Senhor, retira-te de mim, porque sou pecador" (Lucas 5.8). Como resultado da pesca maravilhosa, Pedro sabe quem ele é.
A palavra de Deus é indicadora da presença de Deus. Aliás, em Deus a palavra e a realidade sempre caminham juntos. Não há separação entre o que Deus é e o que Deus diz. Em Deus palavra e ação são uma só realidade. Se intercomunicam construtivamente e em harmonia. Apontam e caminham na mesma direção. Lá no início do livro de Gênesis, onde se dá testemunho acerca da criação temos um exemplo de como isso acontece: "Disse Deus: Haja luz; e houve luz. E viu Deus que a luz era boa" (Gn 1.3-4a).
A palavra de Deus é geradora de vida. Quando Deus fala a vida brota. Quando Deus silencia o mundo se desintegra. Por ocasião do encerramento do Terceiro Congresso Latino-Americano de Evangelização (CLADE III) eu tive oportunidade de me expressar acerca disso: "Se não há palavra do Senhor, o mundo emudece...Se não há palavra do Senhor, o verde dos campos se transforma em deserto. Se não há palavra do Senhor, a festa se acaba, a dança pára, a música silencia, a comunidade fica triste, a cidade sem esperança, a vida sem sentido. Se não há palavra do Senhor, a guerra se instala, o ódio determina as relações humanas, a ganância sobe ao trono, a opressão se legitima e a morte proclama vitória. Porque é a palavra do Senhor que é a palavra de vida. É a palavra do Senhor que faz brotar a vida. É a palavra do Senhor que é a palavra de esperança que vence o caos, que vence a morte e proclama a vitória
Quando Deus fala, o mundo emerge, porque é palavra criadora. Quando Deus promete, ele cumpre, porque é palavra fiel. Quando Jesus nasce, os anjos cantam, porque Deus visitou o mundo e se fez palavra encarnada. Quando Jesus toca em Lázaro, este se levanta, porque o toque de Jesus é toque de vida. Quando Jesus morre, Deus fala do seu amor e do seu compromisso com a salvação. Quando o túmulo amanhece vazio, Deus canta acerca da vitória sobre a morte e proclama em alta voz que a semente da eternidade já brotou e a morte está com os dias contados". A Palavra de Deus é palavra de vida.
Quando Deus fala nós trememos
Quando Deus fala nós trememos na base da nossa própria existência. É muito interessante observar, nas Escrituras, as reações das pessoas diante da palavra-presença de Deus. Diante dele, por assim dizer, não se fica de pé, como vimos acontecer com Pedro por ocasião da mencionada "pesca maravilhosa" (Lc 5.1-11). As vulnerabilidades e os pecados afloram numa dimensão quase que insuportável. Moisés, quando diante do Deus da sua vocação, se percebe "pesado de boca e pesado de língua" (Ex 4.10). Isaías se identifica como "perdido"diante da presença daquele que é "santo, santo, santo...". A sua própria pecaminosidade bem como a do seu povo afloram em gritante contraste com a presença de Deus: "Então disse eu: Ai de mim! Estou perdido! porque sou homem de lábios impuros, habito no meio dum povo de impuros lábios, e os meus olhos viram o Rei, o Senhor dos Exércitos!" (Is 6.5) Jeremias parece ter uma crise de regressão quando Deus bate à sua porta com a palavra da vocação: "Então lhe disse eu: Ah! Senhor Deus! Eis que não sei falar; porque não passo de uma criança"(Jr 1.6).
No caso de Ezequiel, com cuja experiência queremos conversar neste artigo, é Deus quem lhe manda ficar de pé, numa espécie de reverência sagrada. O próprio Ezequiel, no entanto, parece não ter muita alternativa diante da presença e da palavra de um Deus que não apenas requer que ele se ponha de pé mas, pela ação do Espírito faz exatamente isso. A cena se transforma numa espécie de solenidade-na-marra: "Esta voz me disse: Filho do homem, põe-te em pé, e falarei contigo. Então entrou em mim o Espírito, quando falava comigo, e me pôs em pé, e ouvi o que me falava" (Ez 2.1-2).
A visão aponta para o rolo
Quando Deus fala o profeta se assusta. Ele treme e geme. Mas quando Deus não fala, o profeta morre de inanição. Pois, o profeta vive da palavra do Senhor. Esta palavra é a razão da sua própria existência. É a palavra de Deus que o vocaciona e o mantém.
O profeta vive não apenas da palavra de Deus mas ele também vive para a palavra de Deus. Ele está a serviço de um Deus que tem uma palavra a dizer; seja ao seu próprio povo, seja a outras nações. Seja na área da adoração a Deus vis a vis a idolatria ou seja na área do interrelacionamento humano, social e politico vis a vis a prática da justiça e da compaixão. Se o profeta vive da palavra de Deus no que se refere a sua própria existência, ele também depende dessa palavra para qualquer coisa que ele tenha a dizer. O profeta não tem causa própria. A sua causa é estar a serviço da palavra que lhe é dada e que ele pronuncia em nome de Deus e como palavra de Deus.
Na experiência do profeta Ezequiel isto adquire um colorido radical. Ou seja o profeta é convidado a abrir a boca e comer a palavra. Se alimentar do rolo: "Tu, ó filho do homem, ouve o que eu te digo, não te insurjas como a casa rebelde; abre a boca, e come o que eu te dou...Filho do homem, come o que achares; come este rolo, vai e fala à casa de Israel. Então abri a boca, e ele me deu a comer o rolo" (Ez 2.8; 3.1,2).
No intento de se comunicar com a profeta Deus faz uso de diferentes instrumentos de comunicação, entre os quais se destacam sonhos e visões. O livro do profeta Ezequiel começa falando que o profeta teve "visões de Deus" (Ez 1.1). O profeta vê visões--"vi os seres viventes; e eis que havia uma roda..."(Ez 1.15)--e ouve a palavra --"Esta voz me disse..."(Ez 2.1)-- de um Deus que quer se comunicar com o profeta porque tem uma missão para este mesmo profeta: "Filho do homem, eu te envio aos filhos de Israel, às nações rebeldes que se insurgiram contra mim..."(Ez 2.3a).
O próprio Espírito de Deus entra em cena neste exercício da comunicação de Deus. O Espírito, por assim dizer, é Deus a serviço de Deus apontando para a palavra de Deus: "Então entrou em mim o Espírito, quando falava comigo e me pôs em pé, e ouvi o que me falava" (Ez 2.2). O Espírito e a palavra sabem o que é a harmonia e não apontam em direções diferentes. Eles caminham de mãos dadas a partir do coração do pai e a seu serviço.
Já em artigo anterior intitulado A Revelação Mora Entre o Rio e o Rei refer-mei ao fato de que, como povo evangélico, nos consideramos o povo da palavra. Esta, aliás, foi uma das virtudes e uma das marcas maiores da Reforma protestante: a redescoberta da palavra de Deus envolta do compromisso e da disposoção de colocar essa palavra na mão, no coração e na boca das pessoas. É por isso que Lutero não apenas anunciou o princípio da sola Scriptura (somente a escritura) mas também traduziu a Biblia para a língua do seu povo e produziu uma série de hinos para que a palavra de Deus também pudesse ser cantada.
Por vezes me parece, no entanto, que estamos deixando de ser a igreja da palavra. Podemos ainda estar levando a nossa Bíblia à igreja mas a nossa relação com ela esta mudando. Ela já não é consultada com a mesma intensidade e inteireza. A nossa relação com a Bíblia está sob a ameaça de ser muito mais seletiva. Ou seja, tendemos a ler na Bíblia apenas as coisas que nos agradam e que reforçam o que pensamos. Creio estar percebendo esta mudança em duas dimensões.
Numa dimensão se pode perceber esta faminta busca da visão e da experiência e não, necessariamente, da palavra de Deus. Ou seja, mais do que ouvir a Deus queremos ter visões e vivenciar experiências fortes. Coisas que fazem cócegas e mexem com as emoções. Coisas que "edificam" a alma. Tudo o que Deus tem para nós, no entanto, é a sua palavra. Palavra que nos assusta, nos coloca de pé e nos envia ao mundo na árdua e difícil tarefa de "arrancar e derribar, destruir e arruinar, e também para edificar e para plantar", como Deus disse ao profeta Jeremias (Jr 1.10). Deus até nos dá visões e sonhos e atua entre nós através do seu Espírito. O resultado final, no entanto, é a Palavra; seja aquela que ele nos dá seja aquela que ele nos manda proclamar. É por isso que se faz necessário dizer que nem a visão e nem o sonho tem vida própria. A sua legitimidade está em relação direta com a radicalidade e a intensidade com a qual aqueles estão submissos e a serviço da Palavra de Deus.
Noutra dimensão eu percebo, entre nós, uma espécie de relativização da palavra de Deus quando sempre e somente anunciamos a saúde e a conquista, a benção e a prosperidade. Se alguém está tomado de uma doença que não quer curar é porque ele não tem fé. Se o outro não consegue sair da pobreza é porque ele não tomou posse das riquezaz que o Senhor tem reservado para ele. Num dia desses, em plena madrugada eu ouvia um pregador abençoar com o fim do desemprego a um grupo de pessoas que haviam respondido ao seu apelo. Com o coração na mão eu não consegui deixar de perguntar se aquela benção realmente havia vindo do Senhor. Por vezes andamos correndo um sério risco de deixar de ser mensageiros da palavra do Senhor, tornando-nos vendedores de ilusões. Eu creio que Deus, para ficar no exemplo em pauta, se comisera dos desempregados e tem o maior interesse em que estes encontrem emprego. Mas eu creio que Deus quer fazer isso sem dar preferência a uns em detrimento de outros. Ademais, Deus quer prover isso fazendo-nos gestar soluções mais profundas, quanto ao desemprego, do que aquelas que se gestam num apelo emocional e, por vezes, inconsequente. Eu diria, por exemplo, que um apelo desta natureza não é inconsequente na medida em que, no dia e nas semanas seguintes, este mesmo pregador monitora, acompanha, chora e celebra, na busca de emprego, com cada um daqueles aos quais ele tão facilmente anunciou o fim do desemprego.
O risco que vivemos é o de que deixemos de ser a igreja da palavra e nos tornemos numa espécie de vendedores de "indulgências materializadas". Neste caso, não estaremos vendendo a "passagem" da alma do purgatório para o céu, ou "assegurando" um lugar futuro no céu, para eventuais compradores, como se fazia na idade média mas passamos a vender saúde (crente não fica doente) e o bem estar (somos filhos do Rei e temos de tomar posse dos bens materiais que Deus nos tem reservado).
A palavra que Deus tem para o seu povo não tem a ver com o consumo religioso, com esta promessa de uma espécie de elixir do bem estar. A palavra de Deus nos coloca de pé, transtorna e reorienta. Nos coloca a serviço da palavra de graça e juízo, da parte de Deus, no mundo que vivemos.
Deus não é apenas o Deus que está a serviço do suprimento das necessidades cada vez mais excêntricas dos cristãos. Nem é ele o Deus que se permite ser colocado a competir num mercado religioso onde é preciso mostrar evidências de quem é o Deus mais "forte". O Deus dos cristãos é o Deus de todas as nações que está empenhado na salvação e no bem estar de todas estas nações. Ele é o Deus que cura e liberta, concede sonhos e visões no objetivo de que ele seja conhecido, a sua compaixão seja percebida e a sua justiça seja abraçada. Ele é o Deus que dá emprego mas também chora por cada um que não consegue emprego no contexto de uma sociedade que parece progredir apenas na medida em que gera desemprego.
Abre a boca. Come o rolo. Alimenta as entranhas!
Colocar-se a serviço desse Deus não é coisa fácil, como se percebe na vida dos profetas. A palavra de Deus só é pronunciável com temor e tremor...e, por vezes, sob risco de vida. Pronunciar esta palavra é o maior privilégio que se pode receber de Deus, mas isso não significa que essa palavra se constitua sempre no anúncio de coisas boas. Por vezes--muitas vezes--o que o profeta tem para anunciar é a insatisfação profunda de Deus com uma pessoa, com o seu povo ou com outras nações. Mas a possibilidade da conversão quase sempre está presente e é nela que reside a esperança do profeta... e do próprio Deus.
Para desincumbir-se da palavra profética é necessário ser preparado para a mesma. O profeta é, pois, vocacionado e preparado. No caso do profeta Ezequiel Deus literalmente alimenta o profeta com a sua palavra. "Abre a boca, e come o que eu te dou" (Ez 2.8) lhe diz o Senhor. E, em nova visão, o profeta vê a mão de Deus estendendo-se para ele e lhe dando de comer.
O que Deus dá de comer ao profeta é a sua própria palavra; "escrita por dentro e por fora", como diz o texto e contendo "lamentações, suspiros e ais."(Ez 2.10). A palavra de Deus é palavra de vida que afeta e abarca toda a vida humana, em sua dimensão pessoal e coletiva. É palavra por inteiro, "por dentro e por fora". A palavra que Deus tem para dizer é, tantas e tantas vezes, uma palavra de lamento. Um suspiro. Como sabemos, a desobediência e a queda humana são absolutamente profundas e amplas. Afetam todas as áreas de toda a vida humana. Assim que quando Deus olha para a humanidade ele "suspira" o suspiro do lamento e da esperança. Deus não cansa de se comunicar com a humanidade porque ele não cansa de esperar. Esperar pela conversão e pela salvação. Esperar pela comunhão com a sua própria criação.
Para poder colocar-se a serviço desse Deus da esperança o próprio profeta precisa ser marcado e alimentado, por dentro e por fora, por essa palavra de Deus. Palavra que não é só uma questão de palavra. Palavra que não é só uma questão de conteúdo racional, de comunicação verbal. Palavra que é vida a convocar outras vidas. Palavra que precisa ser comida e ruminada para depois poder ser compartilhada. Palavra a ser transmitida com a vida. Palavra a ser encarnada. Por isso, a palavra que Ezequiel recebe é palavra também para a sua cabeça e coração. Palavra para o seu ventre, para as suas entranhas. A palavra de Deus precisa entrar, pois, nas nossas veias e tripas: "Filho do homem, dá de comer ao teu ventre, e enche as tuas entranhas deste rolo que eu te dou". (Ez 3. 3a).
Eu sou de uma geração que tendia a ter uma relação cerebral com a palavra de Deus. Ela carecia de ser lógica. Compreensível. Argumentável. Mas, como esta palavra se nega a fazer o jogo da nossa expectativa manipuladora a gente acabava por não mergulhar na intimidade da mesma e não deixava de ter este sabor de fome a juntar saliva no fundo da boca. Para mim tem sido fantástico me relacionar com a palavra de Deus a partir do ventre e das entranhas. É lá que a gente acaba experimentando o quanto esta é uma palavra de vida.
É rolo com gosto de mel
Eu lembro da época em que os nosso filhos eram menores. Como eles nasceram em sequência, em forma de escadinha (como será que isso aconteceu?) não era muito fácil a gente ter uma noite inteira de sono. Se não era o menor era o outro (que também era pequeno) que dava a sua choradinha. E quando, em pleno inverno, a gripe batia a coisa ficava séria e a noite um desastre. Misericórdia!
Uma das coisas que a gente fazia, como medida de emergência, era passar a mão no pote de mel e, meio dormindo, fazer o menino, que também estava meio dormindo, engolir uma colherada de mel. A instrução, nesta circunstância, era a seguinte: "segura o mel na boca. Deixa ele escorrer devagarzinho pela garganta". A esperança era de que o mel acalmasse a tosse do menino e desse aos pais a possibilidade de dormir. Ademais, o mel não corria o risco de ser rejeitado. Pois, além de ser medicinal ele é doce. É gostoso. E ainda por cima é nutritivo. Alimenta.
É assim com a Palavra de Deus. Além de ser curativa ela alimenta e adoça a vida. A Palavra de Deus, pois, oferece sabor à nossa vida, rumo para os nossos caminhos, correção para os nossos desvios e alimento para as nossas fomes e carências.Sem ela não dá para viver. Sem ela a vida fica sem graça rumo. Um perambular pelo deserto. Um quebra-cabeça sem ponto de chegada. Um esqueleto sem carne. Uma comida sem tempero. Uma sobremesa sem sabor. Pois o profeta Ezequiel comeu do rolo e conclui que ele lhe foi doce como o mel: "Eu o comi, e na boca me era doce como o mel" (Ez 3.3b). Eis um caminho sobremodo excelente. Andemos nele...com a boca cheia de mel.
"Come este rolo, vai e fala..."
É importante que nesta conversa sobre a Palavra de Deus, não se deixe de ressaltar que esta palavra não é ração de engorda, adoçante e nem uma espécie de "elixir do bem estar". Francamante falando, no entanto, é nisso que tendemos a querer transformar esta mesma palavra. Alguns de nós, por exemplo, nunca estamos prontos para nada a nível de exercício ministerial. Dizendo-nos despreparados nos esquivamos de qualquer compromisso dizendo que ainda precisamos crescer mais para então poder dar a nossa resposta de compromisso e engajamento. A realidade é que com esta atitude não se cresce. Apenas se engorda. E se tem uma coisa chata é crente gordo. Inchado de argumentos e escusas. Devorador de teorias e teses. Argumentador incansável e imóvel.
Outra tentação é a de querer transformar a palavra de Deus numa espécie de adoçante, com uma preferência especial para seleções especiais dos salmos. Só queremos estabelecer contato com àquelas porções das escrituras que nos trazem "enlevo espiritual". Quando, num momento ou outro, a palavra é de exortação ou quando o desafio profético começa a chegar perto, nós viramos as costas murmurando e dizendo que a nossa vida já é tão difícil, que "não vamos para o culto a fim de ouvir coisas desagradáveis". E, não por último, nós gostamos de olhar para a palavra de Deus como aquela que nos faz sentir bem. Palavra que nos põe em contato com as realidades do "sublime sentimento de enlevo espiritual" A palavra passa a ser o nosso "elixir do bem estar". O problema com todas estas tentações é que elas desvirtuam a natureza e o caráter da Palavra de Deus mas acabam querendo intrumentalizar o próprio Deus e a sua palavra a nosso favor. A nossa serviço. Como sabemos, no entanto, e palavra de Deus não se deixa manipular. Na sua soberana independência é ela que nos alcança, nos põe de pé, como é o caso em Ezequiel, e nos coloca a seu serviço. A palavra de Deus é para ser vivida e proclamada.
O profeta Ezequiel tem experiências profundas com Deus e a sua palavra. Ele tem visões inúmeras. Os céus se abrem diante dos seus olhos. As suas próprias entranhas são afetadas e remexidas por esta presença-palavra de Deus. Mas tudo isto tem um objetivo. Ou seja, "vai e fala à casa de Israel" (Ez 3.1). Deus nos dá a sua palavra a fim de que nos tornemos instrumentos desta sua própria palavra. Ele nos vocaciona através da sua palavra e nos alimenta com a sua palavra no intuito de que nos tornemos presença e voz de Deus no mundo. Este, pois, acaba sendo o nosso assutador privilégio; ser, viver e proclamar a palavra de Deus para um mundo simultaneamente carente e rebelde. Eis o que é a nossa vocação. Assustadora! Enobrecedora! Fiquemos, pois de pé nos diz o Espírito. Deus quer falar conosco.
Publicado originalmente na Revista Ultimato.
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